quarta-feira, agosto 17, 2011

escravidão moderna ;



"O quadro encontrado pelos agentes do poder público, e acompanhado pela Repórter Brasil, incluía contratações completamente ilegais, trabalho infantil, condições degradantes, jornadas exaustivas de até 16h diárias e cerceamento de liberdade (seja pela cobrança e desconto irregular de dívidas dos salários, o truck system, seja pela proibição de deixar o local de trabalho sem prévia autorização). Apesar do clima de medo entre as vítimas, um dos trabalhadores explorados confirmou que só conseguia sair da casa com a autorização do dono da oficina, só concedida em casos urgentes, como quando levou seu filho ao médico.

Quem vê as blusas de tecidos finos e as calças da estação nas vitrines das lojas da Zara não imagina que, algumas delas, foram feitas em ambientes apertados, sem ventilação, sujos, com crianças circulando entre as máquinas de costura e a fiação elétrica toda exposta. Principalmente porque as peças custam caro. Por fora, as oficinas parecem residências, mas todas têm em comum as poucas janelas sempre fechadas e com tecidos escuros para impedir a visão do que acontece do lado de dentro das oficinas improvisadas. 

As vítimas libertadas pela fiscalização foram aliciadas na Bolívia e no Peru, país de origem de apenas uma das costureiras encontradas. Em busca de melhores condições de vida, deixam os seus países em busca do “sonho brasileiro”. Quando chegam aqui, geralmente têm que trabalhar inicialmente por meses, em longas jornadas, apenas para quitar os valores referentes ao custo de transporte para o Brasil. Durante a operação, auditores fiscais apreenderam dois cadernos com anotações de dívidas referentes à “passagem” e a “documentos”, além de “vales” que faziam com que o empregado aumentasse ainda mais a sua dívida. Os cadernos mostram alguns dos salários recebidos pelos empregados: de R$ 274 a R$ 460, bem menos que o salário mínimo vigente no país, que é de R$ 545.

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A primeira oficina vistoriada mantinha seis pessoas, incluindo uma adolescente de 14 anos, em condições de trabalho escravo. No momento da fiscalização, os empregados finalizavam blusas da Coleção Primavera-Verão da Zara, na cor azul e laranja (fotos acima). Para cada peça feita, o dono da oficina recebia R$ 7. Os costureiros declararam que recebiam, em média, R$ 2 por peça costurada. No dia seguinte à ação, 27 de junho, a reportagem foi até uma loja da Zara na Zona Oeste de São Paulo (SP), e encontrou uma blusa semelhante, fabricada originalmente na Espanha, sendo vendida por R$ 139.

Fonte: Blod do Sakamoto

Refaço a minha sugestão do último post: assistam A Liga.

segunda-feira, agosto 15, 2011

frescura televisiva;

Que me desculpem os mais sociáveis, mas haja saco para tanta hipocrisia. As pessoas adoram mostrar toda a sua compaixão diante de casos de sofrimento ‘modelo’, e esquecem que vivem uma realidade pior ou igualmente ruim – mas é muito mais bonito, pelo menos socialmente, demonstrar a sua preocupação com o próximo. Próximo distante, é importante dizer.

Domingo, e por longas horas, fizeram uma enorme reportagem a respeito de um artista famoso que hoje figura na miséria. Pelo resumo, que fui obrigada a aturar diversas vezes, porque mesmo sem nem ao menos passar pelo canal que transmitia, mas parece que a minha mãe não entende bem o que significa o ‘não me interessa’. Enfim, a história era triste – filho deficiente, problemas de saúde e tudo mais que seja digno de um drama televisivo.

Não quero aqui parecer uma desalmada que não se comove com a dar alheia, mas acho absurdas as proporções que são destinadas as figuras televisivas. Quantas vezes viram alvo de reportagens nesse estilo, ex-jogadores que gastam toda a sua fortuna com mulher e negócios destinado ao fracasso, ou mesmo algumas pessoas que acreditavam que sua fama seria eterna e nada deram valor aos ganhos de quando estavam no auge? Uma formula jornalística estúpida que sempre dá certo, afinal se não há púbico, não interesse em se transmitir tal coisa.

A minha revolta é quando penso em quantas pessoas REALMENTE merecem alguma compaixão. Há algumas semanas o programa A Liga mostrou o drama de quem passar por uma desapropriação. É claro que sempre existe aquela pessoa que faz o imenso favor de morar um local de risco, e não entende que é para o próprio bem que precisa sair daquele lugar – e mesmo essas, quantas delas tem escolha? A questão é que são momentos que realmente partem o coração – e quem me conhece sabe que ficar emocionada por dramas humanos não é realmente algo recorrente comigo -, mas você vê pessoas que lutam por toda a sua vida para conseguir construir uma casa mínima, ter alguns móveis, e, de repente, perde tudo. Para alguns resta a resposta do ‘o Estado vai ressarcir’, mas quando? E a questão não é puramente financeira, mas sentimental, é a dedicação que se coloca naquele lar e, seja por qual motivo, assiste-se o seu sumiço.

Então, simplesmente, é no mínimo nojento ver a comoção causada quando um artista está sofrendo. Qualquer pessoa é digna de nossa compaixão, respeito e mesmo assistência, mas não entendo como alguém que teve suas chances – não importa se foi 15 segundos de fama ou anos de carreira – contra aquela pessoa que lutou a vida inteira para ser honesta – afinal, o nome é a única coisa que lhe cabe. Sinceramente, poupem meu tempo quando forem chorar as pitangas porque você, que teve suas chances, não conseguiu o que queria – ali no baixo ao lado tem alguém chorando por não saber por quanto tempo terá um teto sobre sua cabeça.



Quem tiver interesse e não tenha visto o programa, podem ver por aqui todas as partes do programa. Cada um sabe o tamanho dos próprios problemas, o quanto custa viver dia após outro, mas isso não lhe dá o direito de ignorar o sofrimento alheio, do próximo - e próximo não quer dizer quem você goste, mas um ser humano como você.

domingo, agosto 07, 2011

melhor interesse ;


Teria sido acertada esta decisão judicial homologatória? Estaria preservado o bem-estar de Chicão? Não há dúvidas que sim. Foram considerados os vínculos afetivos e familiares existente entre eles. Afinal, era ela a mãe socioafetiva da criança, pois a mãe biológica sempre viajava pelo país a trabalho. Era Maria Eugênia quem cuidava da sua educação, quem estava ao seu lado no dia a dia, acompanhando o seu desenvolvimento e crescimento. O avô, por seu turno, tinha pouco contato com o neto e não havia nenhum laço relevante entre eles.

O que deveria ter sido verificado era se Cássia, Eugênia e Chicão formavam, verdadeiramente, uma família. Afinal, família não é um agrupamento natural, mas cultural. O que importa é a existência de pessoas que cumpram na vida uma das outras o papel paterno e materno, inexistindo vinculação destes como genitores biológicos. Neste caso, portanto, não há dúvidas de que foi atendido o Princípio do Melhor Interesse da Criança. As partes souberam despir-se de preconceitos, para buscar o bem-estar de Chicão, pois é claro que ele se sentiria muito melhor dando continuidade à sua vida, no seu ambiente social, com a pessoa que lhe nutre afetividade, e lhe é fundamental para sua estruturação psíquica, do que estar em companhia de alguém que, embora 'tenha seu sangue', não tivesse com ele ligações afetivas.


Silvio Neves Batista a respeito do caso Cássia Eller.
Guarda e direito de visita. Revista Brasileira de Direito de Família, n.5. abr/mai/jun.2000.

sexta-feira, agosto 05, 2011

Famílias Modernas;

Quase uma semana, certa retração da mídia, mas ainda assim o mesmo assunto nos jornais mais sensacionalistas: o possível suicídio da namorada de um jogador da segunda divisão do futebol brasileiro. O que não foi explorado pela mídia televisiva, exaustivamente foi exposto pelo mundo virtual. A história não é exatamente novidade: um casal jovem e desproporcional, um rapaz em início de carreira, uma menor de idade e uma fatalidade – cada vez mais típico.

É amplamente discutido se o rapaz poderia ou não ter empurrado a garota pela janela, se as imagens em que ele mostra desespero eram verdadeiras ou se mesmo se a tal menina teria coragem ou não de atentar contra a própria vida. Também foi levantado o fato de um atleta ter problemas com o álcool, o relacionamento saudável ou não vivido por eles e até mesmo o tamanho da possessividade revelada pela vítima, por seu – quem sabe – algoz. Discussões tão recorrentes quanto o caso, que todas as semanas estampam jornais e já caíram na banalização popular – a não ser que tenha requintes de crueldade, já não são mais atraentes. 

O que nunca parece ser considerado é a atitude da família – não posterior ao acidente, mas antes. Por que nunca se questiona o quanto as famílias renunciam ao seu poder e dever como pais? Qual é a razão de, nesses momentos, nunca existirem críticas a respeito do posicionamento tomado por eles? É óbvio que se deve respeitar o pesar que passam durante esse momento, mas a super exploração da informação não é a título de exemplo para outros casos? Não é exatamente esse o argumento usado por diversos repórteres quando exageram na sinceridade em suas perguntas e opiniões?

Partindo deste caso, é fácil notar o quão anunciado era a tragédia. Segundo a família de Flávia de Lima, 16, a garota mantinha um relacionamento há mais de 2 anos com o jogador Rafael Silva, 20, e que moravam juntos já há um ano. Atualmente a diferença de idade não parece mais ser algo a ser considerado. Famílias que tem seu início precocemente, com meninas que saem de casa antes mesmo de entenderem a sua nova condição de mulher, adquirida dia a dia. Com 14 anos é a saída da infância, tomando por base o Direito Penal, mas aparentemente essa constatação não parece ser observada pelas famílias brasileiras. Uma garota, uma criança, que mantinha um relacionamento com um homem de 18 anos. Que um ano depois, já deixava seu lar, a proteção familiar e investia na constituição família – mal tendo terminada a educação escolar básica.

Em algumas reportagens a mãe da garota afirmou que a filha era decidida, totalmente determinada no que desejava. O que, no mundo de tantas outras pessoas, seria chamado de birra infantil. Entretanto, o que antes parecia ser tratado com proibições, castigos, hoje é deixado a própria sorte. Até uma década atrás, um pai não permitira que sua filha tivesse qualquer relacionamento com esta idade, quem dirá com um rapaz já maior de idade. Mas aqueles tempos são chamados de arcaicos, ‘pais quadrados’, distantes da modernidade vivida hoje. Modernidade? Será mesmo que o afastamento do controle que os pais exerciam sobre os filhos, é um caminho desejável? É claro que dominação nunca é aceitável, o cerceamento de expressão é obviamente deplorável, mas isso nada tem a ver com as imposições normais que se espera de um ambiente familiar.

A história, infelizmente, não é novidade. O que antigamente era feito pelo casamento – meninas tão novas que eram entregues para o matrimônio, muito antes de terem idade o suficiente para entenderem o próprio corpo -, foi superado pela liberdade dada aos filhos de escolherem o próprio destino, ainda que houvesse regras e limites a serem seguidos. Hoje, aparentemente, parece um lar ser lei. Os filhos em sua independência precoce e desmedida se entregam pra uma vida adulta muito antes de terem capacidade de entender exatamente o que é que tanto desejam; por outro lado, os pais, abrem mão de qualquer limite com a estúpida desculpa de que possuem filhos geniosos, que são liberais e só querem a felicidade dos mesmos. Já dizia a velha frase que liberdade não é o mesmo que libertinagem, mas esse parece ter sido mais um dos provérbios aposentados e considerados não dignos da modernidade. Infelizmente, esse caso lastimável de acidente, ou mesmo homicídio, figurará no banal, com sua recorrência insistente, sempre amparada pela busca da justiça para o ato final, ignorando o estopim do problema real.

 
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